UMBANDA E ESPIRITISMO

Desavença entre Adeptos



Existe grande desavença entre os adeptos do Espiritismo Kardecista (que aceita a doutrina codificada por Allan Kardec) e os do Espiritismo Umbandista. Uns e outros fazem questão de dizer que são "espiritas". Mas os primeiros declaram que foi Allan Kardec quem criou e fixou o termo para designar especificamente o movimento espiritualista por ele iniciado e que, por conseguinte, outros não podem usurpar a mesma designação para um movimento essencialmente diferente. É a razão por que reclamam o termo "espírita" para si exclusivamente. Nem por isso os umbandistas deixam de chamar-se "espíritas". 

Podem alegar em seu favor que a Umbanda de fato não é essencialmente diferente do Kardecismo, Em vista disso a Federação Espírita Brasileira, que lidera entre nós o movimento kardecista, declarou oficialmente: "Baseados em Kardec, nos é licito dizer: 

Todo aquele que crê nas manifestações dos Espíritos é espirita; ora, o umbandista nelas crê, logo o umbandista é espirita… Assim, todo umbandista é espirita, porque aceita a manifestação dos Espíritos, mas nem todo espírita é umbandista, porque nem todo espirita aceita as praticas de Umbanda" {Reformador, órgão oficial da Federação Espírita Brasileira, Julho de 1953, p. 149).

Entretanto, muitos kardecistas não se conformaram com tão "intempestiva declaração" e — apesar de alardearem ilimitada tolerância — persistem em combater com estranha intransigência o movimento umbandista. 

Poderíamos, aliás, acrescentar mais uma razão que, a nosso ver, justificaria plenamente a aspiração dos umbandistas quando teimam em chamar-se "espíritas": é que eles não apenas creem nas manifestações dos Espíritos (coisa que nós católicos também admitimos como possível), mas, além disso, praticam sua evolução e provocam suas manifestações (prática, que nós católicos reputamos ilícita e pecaminosa porque, como veremos, rigorosamente vedada por Deus). 

E já que os nossos kardecistas não sentem dificuldades em qualificar como espíritas semelhantes movimentos que, na Inglaterra e América do Norte, se dedicam a evocação provocada dos espíritos, muito embora não admitam a codificação kardeciana, nem mesmo a reencarnação, pela mesma razão deveriam eles reconhecer também como verdadeiros irmãos espíritas os adeptos da Umbanda.

IDENTIDADE SUBSTANCIAL ENTRE UMBANDA E ALLAN KARDEC

Mas existe ainda outra razão muito mais decisiva que nos permite identificar a Umbanda com o Espiritismo. Pois todos os umbandistas aceitam a doutrina ou filosofia kardecista da reencarnação. Como este ponto será de importância fundamental para uma tomada de posição católica perante a Umbanda, é necessário demonstrar nossa afirmativa. Apresentamos os seguintes documentos:

1) O já citado Catecismo de Umbanda (Rio 1954) declara em seu prefácio querer expor apenas "o que é aceito pela maioria dos umbandistas" (p, 5). Na p. 66 damos com a seguinte pergunta: "Há alguma diferença entre Umbanda e Kardecismo?" A resposta é inequívoca: "Doutrinariamente, não há diferença. A doutrina de Umbanda é a mesma que a de Allan Kardec. A sua base é a evolução, o progresso espiritual, através do sofrimento, no decorrer das reencarnações, sendo necessária a prática da caridade para apressar-se esse desenvolvimento".

2) Numa obra que se declara "aprovada e adotada oficialmente pela Confederação Espírita Umbandista", editada no Rio em 1951 sob o titulo Doutrina e Ritual de Umbanda, lemos a p. 68: "O umbandista acredita na lei das reencarnações, na lei da evolução das almas, aceita a revelação de Jesus Cristo. Dois pontos distinguem o umbandista do kardecista: a) a prática da comunicação com os espíritos elementais; b) o ritual, muito complexo na lei de Umbanda, que é uma religião de culto externo",

3) Emanuel Zespo (pseudônimo de Paulo Menezes), já considerado em alguns meios "o codificador de Umbanda", ensina também que "o Espiritismo de Umbanda aceita integralmente a revelação kardeciana" (O que é a Umbanda, Rio 1949, p. 47) e, na p. 51 do mesmo livro, o autor esclarece: "Dos diversos tipos de espiritualistas existentes no mundo, o umbandista é dos que praticam a mediunidade espiritualista, e, como os espiritas, o umbandista comunica-se com os desencarnados, aceita a lei das reencarnações, aceita a doutrina do Evangelho, e procura praticar a caridade como a entendeu Kardec. Ora, dois pontos apenas, distanciam a Umbanda de Kardec: 1) a prática da comunicação com os elementais, os espíritos da natureza; 2) a sua ritualística. … A Umbanda aceitou a comunicação com os desencarnados, a terceira revelação kardeciana, absorvendo do Espiritismo todos os seus ensinamentos".

4) Em vista de tudo isso se compreende que o Primeiro Congresso de Umbanda tenha aprovado com unanimidade esta quarta conclusão: "Sua doutrina (de Umbanda) baseia-se no princípio da reencarnação do Espírito em vidas sucessivas na terra, como etapas necessárias a sua evolução planetária".

Destes documentos todos inferimos com razão que existe identidade substancial entre a doutrina kardecista e a umbandista. Verificamos no ponto anterior que também na prática da evocação provocada dos espíritos há igualdade essencial entre os dois. Não diferem, por conseguinte, em sua essência, estes movimentos: baseados ambos substancialmente na mesma prática, procuram orientar seus adeptos com uma doutrina essencialmente idêntica. Daí já se vê que a posição dos católicos perante a Umbanda não será muito distinta da já conhecida atitude frente ao Espiritismo kardecista. Todavia, devemos assinalar duas diferenças.

Axé


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